terça-feira, 2 de julho de 2024

Animação premiada em Sitges e vencedora da categoria Melhor Longa-Metragem da 15ª CRASH, será exibida com acessibilidade no Dia Internacional da Animacão de Goiânia




A Outra Forma, com direção de Diego Felipe Guzmám, será exibido com legendas descritivas no dia 28/07, às 19h, encerrando em grande estilo a programação do 16º Dia Internacional da Animação de Goiânia. 

Realizado em 2022 em animação tradicional, o filme tem classificação livre e é uma co-produção Brasil/Colômbia. A trama é sobre um homem obcecado em se encaixar em um mundo geométrico que enfrenta o dilema de se tornar um quadrado ou liberar a verdadeira forma que reside dentro dele. 

Ao ser eleito melhor filme da 15ª CRASH , os jurados Ciro I. Marcondes, Keith Valéria Tito e Renné França justificaram: "o júri da mostra competitiva para longas-metragens da 15ª CRASH decidiu, após elaborada deliberação, atribuir o prêmio principal ao filme A Outra Forma, produção de Diego Felipe Guzmám, pela capacidade de realizar uma contundente reflexão sobre as molduras que encarceram nossa realidade social a partir de cenas inventivas e surpreendentes tanto no ponto de vista diegético/literal quanto no simbólico, em uma animação de alta qualidade."

A seguir, leia o texto sobre a obra de um dos curadores publicado no catálogo do festival e já reserve o seu domingo para assistir essa animação nada quadrada.


A OUTRA FORMA: Uma animação nada “quadrada”.

Márcio Paixão Jr.



Coisa de criança. Via de regra, é assim que os desenhos animados são vistos pelos não iniciados. Tal preconceito não se justifica, mas se explica: a produção mainstream do cinema de animação mira o amplo e consumista público infanto-juvenil. O sucesso de um filme não se mede exclusivamente pela obra em si, mas no alcance comercial de seus produtos derivados. Num mundo cada vez mais infantilizado – vide a enxurrada de super-heróis a sequestrarem as salas de cinema planetárias –, essa perspectiva mostra-se mais e mais hegemônica.


Vejamos, por exemplo, os filmes da megacorporação Pixar. O apurado desenvolvimento de suas técnicas de animação 3D acabaram por determinar os padrões formais de todo um campo do audiovisual. Esteticamente, as películas da Pixar são iguais entre si, que por sua vez são iguais às da Disney e de toda e qualquer produtora que anseie disputar alguma fatia desse bilionário mercado. Homogeneização visual onde poderia existir autoralidade e alteridade. Cruel ironia para uma linguagem que é o berço do cinema e potência infinita no que tange à criação de imagens em movimento. 


Dirigido por Diego Felipe Guzmán, a coprodução Colômbia-Brasil A Outra Forma transita livremente na contramão do cinemão animado. Para começar, às favas com o 3D digital. Produzido na clássica técnica de animação quadro-a-quadro e com um apurado trabalho de colorização, o filme reverbera clássicos da animação como Planeta Fantástico (René Laloux, 1973) e Heavy Metal – Universo em Fantasia (Gerald Potterton, 1981). Aliás, a ligação com os tropos da incontornável revista de HQs Heavy Metal (versão americana da original francesa Métal Hurlant, onde despontaram nomes do calibre de Moebius, Philippe Druillet e Richard Corben) é evidente. Tal e qual a maioria dos seminais quadrinhos ali publicados, A Outra Forma é ficção científica simultaneamente casca grossa e cabeçuda. 


Não espere uma trama redonda onde todas as perguntas são acompanhadas de previsíveis respostas. No filme de Diego Guzmán (que também assina o roteiro), ao longo de uma hora e meia acompanhamos um futuro no qual os seres humanos buscam, a quaisquer custos, moldar seus corpos – e consequentemente suas mentes e sensibilidades – a um padrão geométrico “quadrado”. Prensas mecânicas são aplicadas pelos próprios cidadãos sobre si, e quanto mais estreitos e perpendiculares seus corpos se tornam, maior o status social adquirido. A ambição final é assumir uma forma geométrica que se encaixe com precisão nas gigantescas torres (World Trade Centers?) constituídas por pessoas totalmente adaptadas, para então ascenderem a uma Lua também cúbica. Alguns, porém, não são quadrados o suficiente para essa ascensão. 


Operando numa chave alegórica e densa, o filme lida com questões como subserviência, alienação e mutilação. Se somos todos retangulares, podemos sempre cair como peças de dominó. Por outro lado, abrem-se frestas: por mais difícil que seja, é sempre possível desenhar um outro mundo, orgânico e sem coleiras. Completamente sem diálogos, a obra de Guzmán é polissêmica, mas jamais autoindulgente. 


Vencedor do prêmio de Melhor Longa Animado em Sitges, 2022, A Outra Forma acumula passagens por Annecy, Havana e Rotterdam até chegar à 15ª CRASH. E comprova que, na verdade, as formas fofas e arredondadas da Pixar é que são quadradas.



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